29.9.11

Mocotó, do chef Rodrigo Oliveira: um post sentimental



Com as pauladas que a gente vai levando pelo caminho, vai ficando calejada. Vai entrando pra dentro da concha. Vai guardando histórias.


Houve um tempo em que eu escrevia mais livremente. Levemente.


Já não posso.


Talvez por isso eu tenha evitado contar de minhas últimas idas ao meu tão querido Mocotó. Pra guardar pra mim aqueles momentos, sem misturar trabalho no meio.


Ou talvez eu tenha evitado escrever simplesmente porque detesto chover no molhado. Até os jornalistas gringos, de François Simon do Figaro (o famoso porém preguiçoso e desinformado, que sequer se dá o trabalho de corrigir seu vídeo em que troca Tordesilhas por Mocotó) ao ótimo Carlos Maribona , da Espanha, já desfiaram elogios.

Pra quê repetir aqui o óbvio? Quem é que já não sabe, com tudo o que se escreve dele, que o Mocotó é uma delícia de programa para um sábado ou domingo preguiçoso?



Mas aí soube de um certo almoço recente na casa de um certo Mr. G. - aquele que encorajou o garoto desde o início - e o coração balançou de saudade. Vontade de compartir.

Taí, vou contar: descobri o menino Rodrigo uns anos atrás, não por matéria de revista ou jornal, mas graças ao mr. G. - aquele que ODEIA ser citado neste blog. Ele teve a esperta ideia de lançá-lo nas altas rodas convidando-o a servir aos bacanas num almoço bico-fino uma mocofava, lado a lado com um cassoulet do Laurent. Foi quando o povo que nunca tinha posto os pés na Vila Medeiros resolveu que valia a pena chamar um táxi especial e ir "desbravar": a mocofava ganhou de lavada!

Pois bem: um tempo depois almoçamos juntos, eu, ele, mr G.

Vi o brilho nos olhos daquele gentil cozinheiro, o entusiasmo febril que só alguns têm, a gentileza, a atenção com que ouvia e absorvia tudo, e logo entendi que ele iria longe.

Hoje, leio com grande satisfação os textos dele na Folha, que falam de coisas não-ditas. De tapioca, que tanto brasileiro desconhece, por exemplo. Textos que abrem os olhos dos mal-informados para a beleza escondida na feiúra da grande São Paulo, para os bairros menos badalados.

Ah, que orgulho tenho do fato de Rodrigo nunca ter se rendido aos mil e um convites para mudar o Mocotó para algum bairro de bacana.... não é hora das pessoas verem que a cidade não termina nos Jardins ou no Itaim?

Não me lembro se antes ou depois daquela comilança no Due Cuochi, finalmente fui conhecer o Mocotó.

Justo no dia em que baixou por lá uma espanholada de responsa, inclusive o Joan Roca. Ah, sim, e o Alex Atala. E... um bando de gente bacana. Que tarde incrível! Até hoje sinto pena de ter perdido a foto histórica que tirei de Joan Roca e Alex Atala parando os carros na frente do Mocotó, fazendo pose no asfalto.

Naquele dia descobri, pela primeira vez, aqueles dados de tapioca incríveis, hoje tão copiados.


Eu, cachaceira e pimenteira que só, me senti em casa desde o primeiro minuto. E lá tem cachaça, sim sinhô, e das boa. E pimenta, e farinha, e cozinha nordestina feita com cuidado mas sem frescuras. E tem filas e filas também - disso, já não gosto nada.... :)



Depois daquele dia voltei, lógico. Não com a frequência que gostaria, já que moro meio longe (oi? Montréal!). Num certo almoço, uns meses atrás, fazia um calor pra nordestino nenhum botar defeito, e eu sentia a cachaça evaporando pelos poros, o suor correndo pelo peito. Felizmente, arrumei lugar no quintal dos funcionários, graças ao seu Zé, bem do lado da geladeira das cervejas...

Apesar do bas-fão, mandamos ver. Do festim, o que mais me impressionou foi o "carpaccio" ou "carpacho" de carne de sol curada, um samba de texturas, um frescor tão bem-vindo. Queijo coalho ao invés de parmesão, lógico.


Mas nesta versão mais clássica, quente, com molho,  alho e pimenta biquinho, a mesma carne de sol, tenra e cheia de gosto, era boa que só, também....


Em outra ocasião, convidei Rodrigo para vir cozinhar para os leitores deste Boa Vida no Astor. Um encontro anual que me é muito querido. Ele veio, de bom grado, e serviu o melhor prato dele que já provei.



Era uma paleta de cordeiro recheada com copa (o pescoço do cordeiro), com cuscuz de farinha d'água. Cordeiro assim, no Brasil, nunca tinha comido. Nada neste mundo é à toa: o cordeiro era bom daquele jeito porque vem de um super produtor - uma família, na verdade, que não faz outra coisa senão criar os bichinhos para depois abatê-los. Dedicação total.

E qualquer coisa com farinha d'água, para mim, é covardia - eu adoro. Mas esse cuscuz, que tinha também jerimum e pimenta cambuci, era chose de lóc.

(Esse almoço, aliás, foi histórico. Aqui, o relato completo).

E aí, em abril passado, o chef Felipe Bronze, do restaurante ORO, veio a São Paulo. Um chef que me encanta cada vez mais por sua vontade de fazer direito, de aprender, de andar pra frente. Estávamos em estúdio, fotografando uns pratos dele para a GQ, já era tarde e ele disse:


- Já que vim até São Paulo... tem um lugar que tenho muita vontade de conhecer, quero ir lá hoje...
- Que lugar?
- O Mocotó. Faz tempo que estou pra ir lá.
- Ah, então vambora! Vou pedir pro Rodrigo botar mais água no feijão!

E lá fomos nós. Desses raros luxos que temos nós, os jornalistas falidos porém independentes: poder gastar uma tarde no meio da semana comendo e bebendo na Vila Medeiros.

E como comemos bem, minhanossasenhora! Aquela tapiocona recheada com carne seca e requeijão-do-norte, suculentíssima.... o feijão novinho, fresquinho, com manteiga de garrafa e bacon... de chorar. Felipe estava pasmo, juro.










Só descobriram no final que era meu aniversário. Felipe se espantou. "O quê? Não quis estar com a família? Assoprar velas do bolo entre amigos?".

Que nada... naquele momento, entre um gole e outro de cachaça, papeando com chefs que admiro e vendo a chuva chegar de mansinho, eu era feliz....


Felipe Bronze, à esquerda, seu Zé Almeida, pai de Rodrigo e fundador
do Mocotó, e o filho bom de tempero
E pra quem não conhece, a história do Mocotó, contada por eles próprios:






 
E a seguir, a explicação de como chegar, roubada do blog do querido Riq Freire, o Viaje na Viagem


Mas a minha teoria é que não é apenas a qualidade da cozinha que fez o sucesso do Mocotó. Sem o Google Maps este restaurante continuaria no completo anonimato :-)

Zaki Narchi + Conceição = Mocotó
Zaki Narchi + Conceição = Mocotó

Brincadeirinha: nem é tão difícil de chegar assim. Basta pegar a avenida Zaki Narchi (a primeira avenidona passando a rodoviária do Tietê na avenida Cruzeiro do Sul), passar pela antiga penitenciária do Carandiru (que virou parque; estará à sua esquerda) e seguir as placas para a Av. Conceição.
À esquerda na Reverendo Israel

À esquerda na Reverendo Israel
Uma vez na Conceição, siga toda vida até aparecer uma rua Rev. Israel Vieira Ferreira (a placa grande dirá apenas “Israel”) e então suba até a Av. N. Sra. do Loreto, que aparecerá à sua direita. Pronto, chegou.

Fórum Gastronomika em San Sebastian, Espanha: Peru e Brasil frente a frente de novo


Fiquei feliz com a notícia: pela primeira vez o Brasil será tema de um dos maiores eventos gastronômicos do mundo, o Gastronomika.

Dias 20 a 23 de novembro, em San Sebastian, no País Basco. Mas com um porém: dividiremos os holofotes com dois outros países que os organizadores consideram "potências gastronômicas emergentes". Adivinhem quem?



México e Peru, aquele paisazo do meu coração. :)

Eu amo o Gastronomika, acho o melhor fórum de todos, vivo dizendo aos que me perguntam.

Primeiro, porque San Sebastian é uma delícia de cidade, com uma tonelada de ótimos lugares para comer. Segundo, porque o time de palestrantes sempre dá banho na concorrência. Este ano, além dos "emergentes", teremos alguns dos maiores cozinheiros do mundo. Joan Roca. Quique Dacosta. Magnus Nilsson. Heston Blumenthal. Grant Achatz. Dani García. E aquele que é para mim o maior (e mais poético) sommelier do mundo, o Josep Roca, vulgo Pitu.

Não perco por nada deste mundo.

A única parte chata é entender direito a programação, disponível só em formato PDF. Para ajudar, recortei abaixo o que eu considero mais importante (tem muito mais além disso!), e pus em negrito e em letras maiores os maiores destaques...







15.00 DEBATE - Enrique Olvera e Bruno Oteiza (México)




10.30h Enrique Olvera, Pujol, México

10h45 Josep Roca -
Vidas Paralelas, Os Vinhos e o Fator Humano

11h30 Victor Argingoniz, Etxebarri
Mago da grelha....
11h45 - ENOTURISMO

"Entre sábanas"
Ferran Centelles,
Crítico de hoteles El País; Fernando Gallardo (Sumiller rest. el Bulli)
y Martín Rigal
Cavas Wine Lodge (Mendoza, Argentina)
(Sala de Cámara)


12.15h Bruno Oteiza e Mikel Alonso, México

13h Mistura de Brasil, México e Peru.

Por Dani García (Calima, Marbella), Pepe Rodriguez (El Bohio, Illescas)
e Paco Roncero (La Terraza del Casino, Madri)



15h15 - DEBATE - Gastón Acurio e Alex Atala

18h Marcos Bassi





10 h Maniocas brasileiras
Helena Rizzo
Rest. Maní (Sao Paulo)
Lugar: Basque Culinary Center*



15H15 DEBATE - GRANT ACHATZ E
HESTON BLUMENTHAL










E mais Gastronomika e San Sebastian:
Almoço no restaurante Akelarè com o chef Daniel Boulud - com vídeo

Um jantar inesquecível no Arzak... com o Arzak!

Minha lista dos melhores restaurantes de San Sebastian e arredores: Bernardina, Etxebarri, Elkano, etc.

Jantar com Anthony Bourdain, Dave Chang et. al no Elkano: os melhores peixes e frutos do mar na grelha que já provei - com vídeo

O restaurante Mugaritz, do chef Andoni Aduriz: único

Abertura do Gastronomika 2010: noitada no Museo del Whisky

Palestra de Ferran Adrià no Gastronomika 2010: vídeo mostrando pratos do El Bulli

Gastronomika: programa completo inclui grandes nomes como Adrià, Andoni, Arzak, Anthony Bourdain e Daniel Boulud 

Chef Josean Martínez-Alija do restaurante do Guggenheim Bilbao anuncia novo - e revolucionário! - restaurante para o início de 2011

Uma semana em San Sebastian para o Gastronomika: as lições que aprendi
e os gim tônicas que bebi


Resumo (em espanhol) do Gastronomika 2010 pelo crítico Carlos Maribona 

Sam Sifton, o crítico do The New York Times, deixa o cargo



Coluna de hoje no Folha Comida:


Descanse em paz, Sam Sifton



Depois de abalar a cena gastronômica, o crítico de restaurantes do jornal 'New York Times' deixa o cargo



A web tem milhões de blogs gastronômicos. A cada instante, novas toneladas de imagens mostram, bem ou mal, o que se come pelas mesas do mundo. Seria eufemismo dizer que se pulverizou o trabalho do crítico (comer fora e reportar o que se viu e provou): comentários sobre restaurantes brotam de todos os lados e metamorfoseiam-se ao serem espalhados nas mídias sociais.
No entanto, a soma desordenada dessas informações jamais igualará o poder de fogo de que gozam os críticos dos grandes veículos -dos quais o mais influente é Sam Sifton, do jornal "The New York Times".

Se a internet castigou o jornal tirando-lhe receita, em compensação deu-lhe centenas de milhares de novos leitores pelo mundo, em tempos em que comer fora e seguir chefs torna-se mania cada vez maior.

Catastrofistas definem jornais como dinossauros em extinção e, no entanto, muitos tornaram-se híbridos, cujo alcance on-line iguala-se ou supera o da versão impressa.
Em junho, Sifton desmontou com magistral habilidade o mito de que o Masa -o caríssimo restaurante japonês- seria o Olimpo do sushi.

Tirou-lhe uma estrela das quatro (cotação máxima) que seu antecessor havia dado. Seguiu-se verdadeiro maremoto na internet de reações contra e a favor, danificando para sempre a imagem do Masa.

Eis porque a crítica de jornal é mais influente e reputada: o carimbo do veículo serve de garantia de que o texto foi apurado e escrito segundo as regras do bom jornalismo.

Enquanto certos blogueiros trocam tapas e beijos publicamente com chefs e colegas e frequentemente usam seus seguidores como moeda de troca, espera-se dos críticos da mídia de primeira linha que não peçam favores, paguem a conta e mantenham uma certa reserva.

Sifton, que chacoalhou a Nova York gastronômica até a raiz desde que assumiu o posto, em 2009, era dos poucos que trabalham assim.

Suas críticas transbordavam humor e audácia, mas na troca com o público ele manteve a ordem no coreto até o fim, anunciado com um tuíte no último dia 13: "Deixo o cargo de crítico para ser o editor nacional do Times. A conta, por favor".

Beijing Design Week tem um pop-up finlandês, o Wonderwater Café


Wonderwater Caféfrom Christian Borstlap

A semana de design de Beijing vai até dia 3 de outubro. E me chamou atenção por causa do café pop-up "finlandês", chamado Wonderwater Café, e a animação acima, que o acompanha e que levanta a questão da água consumida para produzir prato x ou y.

Do site Nowness.com, de onde tirei a novidade:

"Mercurial art director Christian Borstlap animates a sample meal from the Finnish Wonderwater Café, a pop-up restaurant launched this week at Beijing Design Week. Aimed at raising awareness of how much water is used to produce traditional Chinese dishes, the café’s menu shows exactly how much “virtual” water is used in making each dish to give the total water footprint of what is consumed. For example, a roast duck includes 6,949 liters for raising and fattening the bird, 166 liters for growing the wheat for pancakes and 137 liters for the sweet bean sauce."
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