2.8.11

Rodrigo Oliveira, Atala, Helena Rizzo, Thiago Castanho, Pedro Martinelli e Harold McGee no Paladar do Brasil

Chef Rodrigo Oliveira, do Mocotó, e Diogo dos Destemperados


Trabalhar não é exatamente minha ideia de um fim de semana gostoso, mas ao ver a agenda do evento Paladar do Brasil logo concluí que eu seria uma tonta de não ir. Vi poucas palestras, é verdade – mas o pouco que vi valeu a longa viagem até aquela lonjura de hotel Hyatt (ontem à noite o táxi de volta custou 50 reais!).

Mas vamos ao que interessa: o evento. Farei um resumo resumidíssimo.

Assisti a uma harmonização de cachaças com queijos “tipo” isso e aquilo. Queijos mezza-boca, exceto o meia-cura à direita na foto.



Cachaças ótimas, exceto a primeira que provamos, chamada Thiago Lopes, que achei agressiva demais na boca (minhas favoritas: Boazinha e Weber Haus, essa última curtida em tonéis de amburana, ou cerejeira).



O papo era conduzido pelo chef Mauricio Maia (um auto-intitulado "cachacier") e o sommelier Manoel Beato, que dispensa apresentações. Aprendi algo novo sobre cada uma das cachaças. E aprendi que cachaça boa não combina com queijos mezza-boca... :)


Vi a sempre graciosa Helena Rizzo preparar dois pratos que já pude provar no Maní, descrevendo tudo naquele sotaque gostoso dela. “Tu pode usar creme”, “Tu bate na Thermomix” e por aí vai.


Dei muita risada na aula do Rodrigo Oliveira do Mocotó em parceria com Ana Rita Suassuna, uma senhora engraçada e espirituosa que sabe tudo de Nordeste (autora do livro Gastronomia Sertaneja - Receitas que Contam Histórias). Ele, muito reverente. Ela, muito solta e carismática. O tema era o milho: fubá, cuscuz, curau, canjica, pamonha, etc. Nessa aula, serviram comidinhas que ilustravam o que iam contando, e duas cachacinhas, o que achei uma maravilha. Nada como matar a cobra e mostrar o pau, não é?

Alex Atala demonstrou uns pratos e técnicas que eu já conhecia mas que encantaram a plateia. Ele soube alinhavar muito bem um peixe e um prato e outro peixe e outro prato de modo a realçar o fio condutor de sua aula: a água. Era gelo mal-picado e água com gás em uma sobremesa, água no arroz meloso de cabeça de garoupa, e assim por diante. Mas o mais importante foi vê-lo falar desta sua fase atual, em que menos é mais. Depois de tanto correr atrás de novidades e técnicas ele hoje tem maturidade suficiente para deixar o ingrediente falar mais alto. Poucas interferências. Produto. Sabores e memórias de viagens – especialmente ao Norte - compartilhados com o cliente, no prato, sem muita tradução. Bonito, isso.





O jovem galã Thiago Castanho, de Belém, sempre com seu irmão Felipe ao lado, deu a última palestra. Falou de um peixe icônico de sua terra – o pirarucu – e trouxe um bichão de 1.52 metros para exibir ao público. Foi uma sensação.


Paraense não gosta de comer pele, couro de peixe, contou o chef do Remanso do Peixe. E, pegando emprestada uma técnica que Rodrigo Oliveira usa para fazer seu torresmo ultra aerado e sequinho, Thiago mostrou como dá para fazer algo parecido com o couro do pirarucu.



Serviu com um açaí à moda deles, bem forte. Um gosto que adquire-se e que não é para o meu bico...



Falou também de como prepará-lo: moqueado, ensopado, defumado, etc. Tudo muito bem ilustrado com vídeos da dupla em campo: à beira-rio, salgando peixe, tirando o aroma de maresia (ou pitiú, como eles dizem) com sal e limão, visitando criatório de pirarucus, etc. Para saber detalhes, recomendo fortemente a leitura do poético post do sociólogo Carlos Alberto Dória sobre essa mesma palestra, neste link.



Mas o que me marcou pra valer foi a apresentação do grande fotógrafo Pedro Martinelli.

O discurso intimista, em salinha com não mais do que vinte ouvintes (muitos, amigos dele de longa data), chegou a ser emocionante. Pedrão falou das várias mandiocas do Brasil. Mostrou um belo vídeo em que índias transformam a mandioca em tantas outras coisas, como a farinha, o xibé e a tapioca (não a que se conhece em São Paulo, algo com o mesmo nome mas bem diferente).

E, no final, fez um discurso inflamado sobre a dor que ele sente ao ver tradições antigas sendo desvalorizadas, ao notar o pouco interesse do brasileiro em conhecer a Amazônia, suas comidas, sua gente e seus problemas. Este post jamais poderia reproduzir a força do que foi dito naquela sala. Felizmente, filmei quase tudo e postarei assim que possível.


As chefs Mara Salles e Roberta Sudbrack


Além da parte séria – as palestras – adorei encontrar colegas de mundinho gastronômico que admiro, e de quem muito gosto, como o Carlos Alberto Dória, a Rita Lobo, o Ricardo Castanho do Guia 4 Rodas e a Nina Horta, pessoa deliciosa. E cumprimentar e ver ao vivo gente que só “conhecia” da Internet, como Neide Rigo e o Diogo dos Destemperados. E, claro, dar meu “olá, queridos” aos montes de chefs e restaurateurs presentes: Benny, Belarmino, Rogério, Alex, Helena, Roberta, Rodrigo, Carla, Helô, Mara, Neka, etc.

Chefs que, pela fama que têm, já dispensam sobrenome.


Achei a maior graça em ver o grande cientista Harold McGee, idolatrado por tantos chefs americanos, passar quase desapercebido pelas salas e saguões. Ele assistiu às palestras da Helena, do Alex, do Pedro e do Thiago Castanho, sempre com uma intérprete ao lado (que, logicamente, jamais poderia transmitir tudo o que era dito e mostrado).






Não resisti. No final, perguntei a ele:


“E então, valeu a pena vir de tão longe?”
“Muitíssimo!”
“Provou algum sabor novo que lhe marcou?”
“Dúzias! Levei várias coisas ao meu quarto – principalmente frutas compradas em um mercando aonde me levaram - e fui cortando pedacinhos, provando, aos poucos, no primeiro dia, no segundo, terceiro...”
“Nossa, mas então eram degustações caprichadas, com anotações cuidadosas e tudo mais?”
“Muitas anotações e fotos! Eram sabores tão novos que eu sabia que teria que experimentá-los mais de uma vez para compreendê-los.”

Boa. Assim ele pode voltar aos Estados Unidos e contar “pros colega” que não é só o Peru que tem milhares de frutas, ervas, peixes e temperos que os norte-americanos e europeus desconhecem...
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