Eu nunca tinha ouvido falar do restaurante Hibiscus, em Mayfair, até conhecer o chef Claude Bosi, confesso. Mas aí, no ano passado, estivemos quatro dias juntos na Lapônia (longa história....) e ao cabo deles resolvi que na próxima ida a Londres teria que ir experimentar a cozinha dele.
Mas mesmo antes de gostar da comida, gostei da pessoa.
Um gentil gigante.
Francês treinado a ferro e fogo e chicotadas do déspota Alain Passard, do L'Arpège (certa noite na Lapônia ele e Pascal Barbot, outro francês top, contaram histórias cabeludas de maus tratos na mão do célebre chef-proprietário do L'Arpège, onde trabalharam juntos). Barbot saiu dali para abrir seu l'Astrance, hoje estreladíssimo e premiadíssimo. Claude foi para Londres e abriu o Hibiscus, que chamou bem menos atenção.
Na minha ida recente a Londres, jantei no Hibiscus sozinha.
Foto: divulgação
Só eu, minha fome e meu caderno.
Claude logo veio dizer alô e avisar que mandaria um monte de pratos de sua escolha. Melhor assim, claro!
Já no amuse bouche ele deu o tom do que estava por vir. Técnica francesa com pitadas muito bem dosadas de criatividade. Cozinha contemporânea mas de personalidade própria. Nada ali trazia ecos de Noma, El Bulli ou Fat Duck: alívio!
Abri os serviços com uma "soda de maçã e hibiscus". Muito a calhar. E a espuma agradavelmente espessa, quase uma musse.
Cavala de Cornwal com molho "sweet'n'sour": um sussuro, quase, de tão delicado, o pouco wasabi quase não se notava, os morangos verdes trazendo a crocância, e os maduros, a doçura.
Aí chegou o garçom carregando panela de ferro que, ao ser aberta à minha frente, soltou nuvem de fumaça perfumada. Eram os aspargos, no auge da estação, que haviam sido salteados na manteiga, depois dormitaram na palha esfumaçada.
Levaram embora os aspargos e voltaram dois minutos depois com eles já no prato, servidos com generosas colheradas de uma hollandaise tinha também um pouco do defumado. Completavam o simples conjunto folhas translúcidas de radicchio, mas o que sobressaía era gostinho de beurre noisette. Francês? Sim, graças a Deus! :)
Mais primavera: ravioli com feijões broad beans, o molho ligeiramente viscoso, com pronunciado sabor de limão.
Dorade de pele ultra-crocante (quase um biscoito!) com cogumelos morilles, feijões de soja e cubinhos
de gelatina de café. Tão bom que esqueci de fotografar....
Boudin (pudim de sangue) com maçãs compressas a vácuo e periwinkles (caracóis do mar). À mesa, verteram o molho fresquinho de salsão. Sabores fortes, combinação clássica (boudin com maçã). Outro acerto!
Detalhes bem-vindos em um restaurante que não tem medo de ser fino. Fine cuisine, serviço à antiga. Très bien.
E dá-lhe ervilhas! Aqui, com mariscos e coelho e espuma de uma laranjinha prima da kumquat. Estranhamente, o gosto que mais me marcou nesse prato foi de chorizo...
Salada de morangos, geleia de salsão, espuma de pimenta Sechuan. Preferiria um tiquinho mais de
morangos e menos de creme mas não há como negar que estava delicioso.
E.... nem tudo foram flores. Achei fraca a sobremesa: tortinha de aspargos com flocos de azeitona desidratada,
e, ao lado, o sorvete de leite de cabra que segue. Já cansei dessas sobremesas quase salgadas, que deixam a gente sonhando com um chocolate...
Mas foi apenas um escorregão em uma noite impecável. O sommelier, francês, casou cada serviço com um vinho mais incrível que o outro. E nesses dias de obssessão com lugares casual, ser servida comme il faut é algo que aprecio imensamente.
Para mim, o menu degustação de seis serviços, a 85 libras por pessoa, é dos melhores custo-benefícios da cidade. Evitando aspargos e azeitona na sobremesa, podem ir sem medo!
(E a quem interessar possa, o Hibiscus levou o 43o lugar no ranking Os 50 Melhores Restaurantes do Mundo).
29 Maddox St, London,
W1S 2PA, Tel: +44 (0)20 7629 299, www.hibiscusrestaurant.co.uk
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