Tenho falado pra vocês que um dos fatores que encorajam sobrepesca de espécies ameaçadas é quando o público pouco sabe, e não se interessa em conhecer os peixes e crustáceos que come. Foi esse o tema, inclusive, da minha coluna desta semana no caderno Comida, da Folha, que focava no atum bluefin.
Sob o risco de entediar quem não tem lá grande vontade de ler tanto sobre o tema, sinto que preciso voltar a bater nessa tecla.... Fica o aviso: este post não faz nada o tipo curtinho-e-levinho, quem preferir que pare por aqui! :)
Aos que entendem francês, recomendo vivamente a leitura da reportagem publicada hoje no jornal La Presse pela crítica gastronômica Marie-Claude Lortie, que repete alguns dos mesmos pontos que levantei também nesta semana na Folha.
A matéria dela foca no Québec, é claro - uma província gigantesca, maior do que muito país europeu, com incrível abundância de produtos da terra e do mar.
Mas a questão-chave é a mesma: se as pessoas tivessem a cabeça mais aberta procurariam comer peixes e moluscos de espécies menos conhecidas, mas nem por isso menos gostosas - e na época certa. Isso aliviaria a pressão sobre o bluefin, o Chilean Sea Bass (Patagonian Toothfish) e o bacalhau, entre outros animais ameaçados.
O golfo do rio São Lourenço está repleto de peixes e frutos do mar de primeira, conta ela. Os melhores chefs de Montréal, como Normand Laprise do Toqué!, sabem disso e procuram servir justamente esses produtos, e não aqueles importados de outros países.
chef Normand Laprise |
Mas é uma questão beeeem complicada. Por dessas grandes ironias, a maior parte do que se pesca no golfo vai para o Japão (de novo ele, o Japão, o grande vilão!). Os japoneses simplesmente pagam mais e pagam no prazo. Sobra pouco para chefs locais como Laprise - e esse pouco acaba inflacionado pelos japoneses. Outro problema: pescadores preferem pescar somente aquilo que tem saída garantida, como a lagosta. Relutam em gastar tempo e esforços pescando coisas que os consumidores não conhecem e não pedem nos restaurantes. Inicia-se assim um ciclo vicioso: o consumidor não conhece e não pede, então o chef não põe no menu e o pescador não pesca, e assim explica-se a gama limitada de peixes e crustáceos oferecidos na maioria dos lugares.
Brasserie T!, em Montreal |
Primeiro, o plateau de frutos do mar de sua Brasserie T! (versão mais barata e descontraída do Toqué!) é um exemplo de diversidade e de repeito ao produto local. Tudo vem da província do Québec ou, no máximo, das províncias mais ao Leste, como Nova Scotia ou New Brunswick.
Mexilhões e vieiras das ilhas Magdalen (essas últimas, disponíveis só três semanas por ano, e servidas em ceviche com moranguinhos de verão). Lagosta do Québec. Camarõezinhos nórdicos (crevettes de Matane)...
Eu não conhecia o whelk (a linda concha no centro, molusco gastrópode primo do búzio brasileiro) - que ele retirou da concha, preparou na chapa e serviu usando a concha como recipiente para o molho aïoli.
Ah, sim, e ouriço de Rimouski na própria concha com creme e brunoise de batata cozida.
O ouriço daqui tem sabor muito mais suave do que o ouriço brasileiro, e espinhas quase macias, esverdeadas, além de ser bem menor. Gostei muito! E embora pareça over "empetecá-lo" com creme de leite e batata, era simplesmente um manjar dos deuses, tive que pedir para repetir!
Mas o que me impressionou foi o cuidado em buscar, o mais perto possível, cada um daqueles elementos do plateau. Quando não acham, é simples: o plateau sai do menu imediatamente!!
Agora, quero achar um restaurante no Brasil que sirva algo equivalente, com uma larga amostragem de produtos dos nossos mares. Quem sabe indicar?
11:30 até o último cliente
Tel 514-282-0808
Tel 514-282-0808
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