25.6.11

Peixes e crustáceos em perigo: um alerta da jornalista Marie-Claude Lortie



Tenho falado pra vocês que um dos fatores que encorajam sobrepesca de espécies ameaçadas é quando o público pouco sabe, e não se interessa em conhecer os peixes e crustáceos que come. Foi esse o tema, inclusive, da minha coluna desta semana no caderno Comida, da Folha, que focava no atum bluefin.

Sob o risco de entediar quem não tem lá grande vontade de ler tanto sobre o tema, sinto que preciso voltar a bater nessa tecla.... Fica o aviso: este post não faz nada o tipo curtinho-e-levinho, quem preferir que pare por aqui! :)

Aos que entendem francês, recomendo vivamente a leitura da reportagem publicada hoje no jornal La Presse pela crítica gastronômica Marie-Claude Lortie, que repete alguns dos mesmos pontos que levantei também nesta semana na Folha.

A matéria dela foca no Québec, é claro - uma província gigantesca, maior do que muito país europeu, com incrível abundância de produtos da terra e do mar. 

Mas a questão-chave é a mesma: se as pessoas tivessem a cabeça mais aberta procurariam comer peixes e moluscos de espécies menos conhecidas, mas nem por isso menos gostosas - e na época certa. Isso aliviaria a pressão sobre o bluefin, o Chilean Sea Bass (Patagonian Toothfish) e o bacalhau, entre outros animais ameaçados.

O golfo do rio São Lourenço está repleto de peixes e frutos do mar de primeira, conta ela. Os melhores chefs de Montréal, como Normand Laprise do Toqué!, sabem disso e procuram servir justamente esses produtos, e não aqueles importados de outros países. 

chef Normand Laprise

Mas é uma questão beeeem complicada. Por dessas grandes ironias, a maior parte do que se pesca no golfo vai para o Japão (de novo ele, o Japão, o grande vilão!). Os japoneses simplesmente pagam mais e pagam no prazo. Sobra pouco para chefs locais como Laprise - e esse pouco acaba inflacionado pelos japoneses. Outro problema: pescadores preferem pescar somente aquilo que tem saída garantida, como a lagosta. Relutam em gastar tempo e esforços pescando coisas que os consumidores não conhecem e não pedem nos restaurantes. Inicia-se assim um ciclo vicioso: o consumidor não conhece e não pede, então o chef não põe no menu e o pescador não pesca, e assim explica-se a gama limitada de peixes e crustáceos oferecidos na maioria dos lugares.

Felizmente, chefs como Laprise remam contra a corrente.

Brasserie T!, em Montreal



Primeiro, o plateau de frutos do mar de sua Brasserie T! (versão mais barata e descontraída do Toqué!) é um exemplo de diversidade e de repeito ao produto local. Tudo vem da província do Québec ou, no máximo, das províncias mais ao Leste, como Nova Scotia ou New Brunswick.


Mexilhões e vieiras das ilhas Magdalen (essas últimas, disponíveis só três semanas por ano, e servidas em ceviche com moranguinhos de verão). Lagosta do Québec. Camarõezinhos nórdicos (crevettes de Matane)... 
Eu não conhecia o whelk (a linda concha no centro, molusco gastrópode primo do búzio brasileiro) - que ele retirou da concha, preparou na chapa e serviu usando a concha como recipiente para o molho aïoli. 



Ah, sim, e ouriço de Rimouski na própria concha com creme e brunoise de batata cozida. 


O ouriço daqui tem sabor muito mais suave do que o ouriço brasileiro, e espinhas quase macias, esverdeadas, além de ser bem menor. Gostei muito! E embora pareça over "empetecá-lo" com creme de leite e batata, era simplesmente um manjar dos deuses, tive que pedir para repetir!

Mas o que me impressionou foi o cuidado em buscar, o mais perto possível, cada um daqueles elementos do plateau. Quando não acham, é simples: o plateau sai do menu imediatamente!! 
Agora, quero achar um restaurante no Brasil que sirva algo equivalente, com uma larga amostragem de produtos dos nossos mares. Quem sabe indicar?



BRASSERIE T!
1425 rua Jeanne-Mance (esquina com rua St. Catherine)
 11:30 até o último cliente
Tel 514-282-0808
           


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