Interrompemos o boletim de fuxicos trancosenses por um post: só para reproduzir a última coluna no caderno Comida da Folha:
Comer ou tuitar, eis a questão
Outro dia, Prince apresentou-se em Montréal e, da plateia, uma chef mandou uma bronca pelo Twitter: "Quem passa um show tuitando parece aqueles turistas que vão ao Louvre e não largam a filmadora".
Não só entendi a comparação como vesti a carapuça. Acostumei-me a narrar jantares em 140 caracteres (nada muito pessoal, foco em temas gastronômicos), chegando a dedicar cinco horas diárias a tuítes.
Pior: de uns meses para cá, adicionei a esse um segundo vício: o aplicativo Instagram.
Experiências e opiniões gastronômicas compartidas publicamente nas redes sociais são uma faca de dois gumes. Por um lado, aprende-se enormemente: naquela serra Pelada consigo garimpar frases de chefs famosos não filtradas por assessorias de imprensa; descubro quais restaurantes andam mais frequentados pelos "foodies" e vejo milhares de fotos de pratos. Essa fonte de notícias personalizadas me mantém por dentro das últimas novidades gastronômicas. Troco mensagens com gente que, não fosse o Twitter, dificilmente estaria tão rapidamente disponível para "conversar", como Daniel Boulud, Grant Achatz, René Redzepi e Massimo Bottura, entre dezenas de outros chefs renomados. Em contrapartida, no afã de ficar teclando e clicando à mesa (e "dando uma lidinha" nos últimos tuítes) acabo vivendo menos intensamente cada lance de um jantar.
Em Barcelona, levei um pito do chef Albert Adrià, irmão de Ferran. Enquanto jantava no 41º, seu novo restaurante, eu tentava "instagramear" o maravilhoso temaki de barriga de atum, cone de alga em uma mão, telefone na outra. Ele veio à mesa e disse: "Esse tem que ser comido no mesmo instante, deixe as fotos para depois". Tinha razão.
Fotomaníacos estão virando praga em restaurantes gastronômicos.
Cliques incessantes quebram o ritmo e a magia de uma grande refeição e incomodam. Eu -e a crescente legião de fanáticos das mídias sociais- não devemos perturbar o prazer de comer bem.
Como um bom foie gras, o ato de dividir em fotos e curtas pensatas o que vivemos à mesa é delicioso -desde que em dose certa.
Alexandra, é muito pertinente esta sua reflexão mas penso que no nosso caso há um lado profissional que nos faz fazer isso. Quer dizer, às vezes pergunto-me se não o faria na mesma caso não vivesse do assunto. Mas é verdade você twitta demais :)))
ReplyDeleteDesejo-lhe um bom ano!
mp
Alexandra,
ReplyDeleteadorei a reflexão. Eu e meu marido fazemos viagens gastronômicas e sempre anotávamos tudo, para guardarmos e termos como referência. Depois de um tempo, os amigos insistiam para que criássemos um blogue.
Ainda me sinto intimidada ao registrar em fotos as refeições, mas estamos aprendendo a documentar tudo sem perder o prazer à mesa.
Um beijo,
Priscila.
www.podeserpradois.blogspot.com
Alexandra, concordo plenamente. E arrisco a dizer que me parece da mesma natureza de quem (deitado) deixa de relaxar, pega o telefone e tira foto do pé incluindo uma paisagem para postar no FB. Ps: Seu blog é fantastico.
ReplyDeleteAbs, Gabriela.